Dois estudos, divulgados nesta semana, chamam a atenção para números preocupantes da violência contra crianças nos territórios que compõem a Amazônia Legal. O primeiro, organizado pelo Instituto AzMina, salienta que a maior taxa de gravidez de meninas entre 10 e 14 anos, no Brasil, é no Norte e em parte do Nordeste. O segundo, elaborado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), aponta que a região apresenta a maior taxa de exposição das crianças às violências sexuais.
A pesquisa do Instituto AzMina mostra que todos os dias, acontecem, no Brasil, 57 partos de meninas entre 10 e 14 anos. Segundo dados retirados do DataSUS, foram 204.974 nascimentos com mães da faixa etária citada, entre 2014 e 2023. A média é de cerca de 20 mil partos realizados anualmente. De acordo com a legislação brasileira, qualquer ato sexual com menores de 14 anos é considerado estupro de vulnerável.
A Região Norte é a apontada como a parte do país com a maior taxa de fecundidade média, totalizando o índice de 5,8 crianças por mil nascidas vivas com mães de 10 a 14 anos. Dos 10 estados com o maior número de gravidezes precoces, todos fazem parte do território da Amazônia Legal — composta por Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão.
O estudo também revela maior exposição de meninas negras e indígenas à maternidade infantil. Das quase 205 mil crianças que deram à luz entre 2014 e 2023, 74% eram negras ou pardas, de acordo com dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc). Outros números do levantamento demonstram que, das 100 cidades brasileiras apontadas pelo estudo do Instituto AzMina com as maiores taxas de fecundidade entre meninas de 10 a 14 anos, 90 têm forte presença de povos originários. Uiramutã, município de Roraima com maior número de populações indígenas, está entre os 100 municípios com maior taxa de fecundidade infantil no Brasil.
Estupros
Já o estudo do Unicef denuncia que a maior taxa de exposição de crianças às violências sexuais é nas unidades da Federação que integram a Amazônia Legal. Conforme a pesquisa, de 2021 a 2023, mais de 30 mil casos de estupro contra menores de 19 anos foram registrados na região.
"As diferenças em comparação ao Brasil podem representar tanto um maior número de vítimas na Amazônia, quanto uma maior porcentagem de identificação de casos na região. De qualquer maneira, as crianças e os adolescentes da Amazônia Legal estão extremamente expostos a diferentes violências. As desigualdades étnico-raciais e a vulnerabilidade social da região, que tem conflitos territoriais, uma larga área de fronteira e grande incidência de crimes ambientais, geram um cenário complexo para a garantia dos direitos da infância, que precisa ser compreendido e enfrentado para assegurar a proteção de cada criança e adolescente", observa Nayana Lorena da Silva, oficial de Proteção contra a Violência do Unicef no Brasil.
A Amazônia apresenta taxas de violência sexual maiores do que o restante do país, com 141,3 casos registrados a cada 100 mil crianças e adolescentes em 2023, 21,4% acima da média nacional, que foi de 116,4. Ainda nesse sentido, enquanto o Brasil teve um aumento de 12,5% nas notificações de estupro e de estupro de vulnerável, entre 2021 e 2022, o aumento na região foi de 26,4%.
As violências letal e sexual impactam de forma diferente meninos e meninas brancos, negros e indígenas na Amazônia. Entre as vítimas de abusos da região, entre 2021 e 2023, 81% eram pretos e pardos e 2,6%, indígenas. Em relação aos registros de homicídio doloso, feminicídio, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e de mortes decorrentes de intervenção policial, a Amazônia Legal também se destaca em relação ao restante do Brasil.
O criminalista Amaury Andrade afirma que a criança — de 10 a 14 anos — que engravidou tem direito à proteção total do Estado, de acordo com a Constituição Federal e com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O problema, porém, está na falta do conhecimento desses direitos, já que a maioria dos casos de maternidade infantil estão interligados a questões de vulnerabilidade parental e financeira.
"A falta de filtragem de conteúdos por parte dos responsáveis também pode expor crianças e adolescentes a um grande volume de informações, muitas delas de caráter sexual, que estimulam a erotização precoce. Isso pode levar ao início da vida sexual antes do preparo adequado, resultando, muitas vezes, em uma gravidez indesejada", adverte.
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